quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Homossexualidades

Um comportamento homossexual não satisfaz a Consciência Teleológica da Espécie mas traduz o triunfo do Ser-humano sobre o determinismo da Espécie; afirma-se ele senhor do seu destino. É o triunfo do SER sobre o corpo, da Vida sobre a existência, do “Espírito” sobre a materialidade.
O Ser-humano é, enquanto existente, totalidade psico-somática; possui um corpo que lhe serve para se expressar, durante a Vida existencial, em comportamentos dialécticos condicionados pelos espaços eco-sociais e pelos tempos em que se tem situado. Estes comportamentos são, uns primários e outros adquiridos, elaborados; enquanto estes são aprendidos através da evolução ontogenética, aqueles, os primários, são filogenéticos, isto é, relacionam-se com o desenvolvimento da Espécie, visando a sua perpetuidade, sujeitos ao Princípio da Conservação da Vida existencial do indivíduo ao serviço dos interesses da Espécie. Estes são tres: beber, comer e copular; são comportamentos de grande complexidade, compulsivos, hipotalâmicos, teleonómicos. É por eles que o recém-nascido vive e sobrevive de modo inato e reflexo, sabendo executá-los sem saber que sabe, factualidade mantida através da existência do indivíduo. É por eles que, numa visão universalista, o Ser-humano se transcende em perpetuidade porque cada indivíduo, não obstante albergar a precaridade no seu corpo, é receptáculo de células germinativas que veículam a imortalidade/continuidade da Espécie quando, e só quando, dinamizadas por acções heterossexuais no comportamento da cópula, - comportamento, por si só, primário, hipotalâmico, corporal, elaborado exclusivamente com acções instintivas, teleonómicas, enquanto o indivíduo julga fazer livremente o que faz por fatalidade, mas por uma “fatalidade” contaminada por conveniências, repressões moralistas, inibições.
Sexualidade é um comportamento humano que não é reductível à cópula. Sexualidade é afectividade expressa em acções inter-individuais, as quais podem, ou não, incluír cópula. Em consequência, a sexualidade é hetero e homo. Reduzir a sexualidade à cópula (falsa arquitrave da heterossexualidade) é reduzir a mulher e o homem a seres instintivos, cegos que servem a Espécie impulsionados pelo cio, isto é, é animalizar o ser humano; esta factualidade tem sido e continua submissa a um indesejável clericalismo fixado e anquilosado num obscurantismo fiel às origens da “moral” judaico-cristã repressora, que mergulha as suas raízes no simbolismo do complexo “pecado original” relacionado com a “árvore do conhecimento do Éden” e configurado numa virtual maternidade assexual, sem prazer e, por isso, santificante da mulher. É esta doutrina agonista que, ainda hoje, defende a procriação como justificação exclusiva da heterossexualidade e que anatematiza a homossexualidade.
A homossexualidade é um comportamento latente em todo o ser-humano, é um estádio do desenvolvimento afectivo-sexual, como se infere do facto de toda a relação primária sujeito-objectum, até à idade de seis meses, ser egocêntrica, isto é, o Outro é, para a criança, apenas a sensação d’Ele; é a emoção da própria criança e a sensação na mesma (criança). Este contexto permanece, de forma inconsciente, durante toda a existência vivida do indivíduo ( hoje criança, mais tarde adolescente, adulto ou idoso), já que uma realidade externa só o é se for, e só depois de ser, uma realidade interna; é que uma realidade é para cada ser o que cada qual pensa e sente dela. A sexualidade implicitando uma relação com o Outro, na sequência objectivada – interiorizada –operada –concretizada, é marcada por uma problemática relacional de dimensão social, conflitual, estruturante e histórica e confere uma evolução afectivo-sexual (hetero ou homo) ao Ser.
Esta dimensão inicia-se na família e a sua génese está no Édipo.
A homossexualidade, assimilada através duma linguagem corporal, não sendo mórbida, pode apresentar-se com expressões que vão do “normal” a um patomorfismo que traduz uma perturbação da afectividade, expressões que são mecanismos de defesa duma angústia depressiva ou fóbica iniciada, experimentada e estruturada antecedentemente, entre os seis meses e os cinco anos de idade cronológica da criança; portanto, a patologia não está na homossexualidade mas sim no ser humano que a expressa.
Este psicomorfismo latente através da Vida existencial do Ser – humano apresenta quatro modelos:
1. Ser inseguro, imaturo, com uma homossexualidade perversa ou pura da relação mãe –criança no estádio prè-Edipiano, coincidente com a fase sensório-motora de Piaget, em que a criança desenvolve progressivamente uma sexualidade em Si, de Si e para Si, isto é, a criança é, em simultâneo, sujeito e objectum. Este contexto, de cariz homossexual, revela-se na heterossexualidade, quando o Ser-humano deixa de se amar em Si para se amar no Outro; o homem, por exemplo, projecta-se na mulher e ama-se nela para, mais tarde, atingida a maturidade afectiva, ser Ser para Outrem.
2. Ser neurótico com uma homossexualidade na qual revela misoginia por recusa do Édipo e de todos os seres semelhantes à mãe.
3. Ser psicótico esforçando-se em reafirmar o ego fragilizado numa super estima mórbida; há regressão à fase edipiana durante a qual, para a criança, o Ser desejado e amado (mãe) era aquele que gostava mais dela (criança) e não aquele de quem ela (criança) mais gostava. O indivíduo, nesta perturbação, aparece como Ser controlador do Outro; é a génese do ciume. Os homossexuais psicóticos (este contexto aparece também na heterossexualidade) não toleram interferências de terceiros e, quando as há, tornam-se agressivos até ao crime. Há regressão ao estádio da triangulação em que a criança se sentia privada da relação linear e exclusiva com sua mãe por aparecimento do pai; a mãe, não obstante gostar dela, gostava também do pai; isto é, no seu espaço surge uma ameaça que tem de ser destruída; está então estabelecida uma dialéctica de agressividade que consubstancia o ciúme.
4. Ser saudável com uma homossexualidade normal; é este um estádio de desenvolvimento e de transição, frequente em idades prè- púberes, para a heterossexualidade normal.
A doença da afectividade pode causar paragem ou atrazo na evolução do desenvolvimento afectivo e perturbar gravemente a sexualidade normal seja a homossexualidade ou a heterossexualidade.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Nada

Na existência, habitualmente vivida alienadamente, "Nada" é coisa nenhuma; é também um mito, - o Ser humano, porque desatento ao viver a sua existência, necessita de mitos; é ainda uma palavra que, em contexto, significa alguma coisa recusada, minimizada, anulada. "Nada" é algo esquecido no subconsciente ou no Inconsciente. Nunca o pensamento, a alegria e a tristeza, ainda que enterrados na nossa interioridade, fundeados no subconsciente ou desconhecidos no Inconsciente, poderão perder-se no "Nada"; eles influenciam e condicionam as acções e os comportamentos cognitivos e emocionais, os nossos gostos, preferências e decisões mesmo quando o nosso existir paulatinamente declina na lenta adaptação à "morte". O arquetípico Nada é o Todo.

Veneza

Havemos de seguir em frente o itinerário de regresso a Veneza.
Hei-de palmilhar aquelas ruas marginais que me levaram ao cais, onde encontrei a alma veneziana de gente sem nome, do marinheiro, do estudante, do artista, do boémio, do intelectual, do angustiado, - do povo de Veneza.
Ao entardecer, quando começa a haver poente no canal e o Relógio da Torre badala as sete, hei-de sentar-me convosco numa daquelas mesas que atravancam São Marcos, a saborear o gelado com o prazer do costume mas tão diferente do habitual, naquele lugar e naquela hora, porque alheado na emoção causada pelo fascínio daquela praça - chic prostituta que, ao crepúsculo, entrega com elegância e sensualidade o seu corpo à multidão desconhecida e promíscua a deambular, entre revoadas de pombos, ao som de melodias de Chopin, de List e Debussy vindas das Arcadas,executadas por castiças orquestras; e, à mesma hora e no mesmo lugar, entrega a sua alma aos que, já nostálgicos, partem nas gôndolas, e aos apaixonados, aos artistas e também a mim, emocionalmente refém dum fascínio que me perde no passado imagético feito realidade naquele lugar e àquela hora.
Havemos de voltar a viver São Marcos. Temos de regressar a Veneza.

Tempo

A Felicidade é conteúdo do Tempo, do Eterno Presente; disse-me Einstein, numa destas noites, em um inesquecível sonho.
No Tempo-Felicidade não encontro saudade de passados, nem incertezas do presente, nem a inquietação de futuro; não encontro a velhice nem a infância, não encontro a adolescência nem a adultícia -- interpretações de percurso pseudocientíficas, tempos de ilusões, momentos de alienação.
Continuarei Feliz no Tempo, tempo sem Princípio nem Fim, continuarei Feliz em Eternidade; mas hei-de voltar, dizer isto mesmo e prosseguir até ao limite, até além de mais além, até ONDE – virtualidade necessária às minhas cogitações e, pelas minhas limitadas aptidões, imprescindível nos meus curtos vôos com asas feitas de resquícios de “penas” que me habitam o inconsciente.