sábado, 19 de janeiro de 2013

Metamorfismos da Senescência, uma Problemática de Perspectivas

A senescência relativa à existência do Ser Humano é um processo biopsicossocial que se inicia na concepção, prossegue no nascimento, na infância, na adolescência, na adultícia, na senilidade e termina na morte. É um processo que actua durante toda a Vida existencial em progressivo desígnio de libertação e autonomia seguido de involução, também progressiva, na qual há perdas biopsicossociais em razão inversa àquela em que foram adquiridas, rumo à senil(idade).

Este dinamismo metamórfico existencial desenvolve-se condicionado aos espaços e aos tempos em que o ser humano se situa, em dialéctica.

Neste involuir o Senil, começando por desprezar o presente e recear o futuro, retrocede para espaços e épocas antecedentes por ele vivenciadas, nas quais tendencialmente se fixa e vive porque lá, neles, ficaram retalhos da sua vida existencial.

É este um comportamento reactivo, de cariz teleológico, à sua existência, agora morta por sofrimento progressivo de diferença, marginalização, isolamento, solidão, indiferença, depressão, silêncio de ruína, esquecimento, desistência e também, muitas vezes, doença cognitiva-afectiva alzheimeriforme.
É que os tempos e os espaços valem só o seu conteúdo; tempo sem fenómenos não existe, nem espaço sem factualidade. Por isso, o Idoso encontra-se lá e lá experimenta alguma qualidade e justificação para continuar a viver a sua existência.

Este conceptualismo é mais que realidade; é Real, absoluto e é mais que necessário; é imprescindível no pensar a humanitarista assistência ao Idoso, permitindo que ele continue a viver as suas experiências confiadamente, em liberdade e autonomia numa ambiência de qualidade tão boa quanto possível.

Compreender o Idoso é uma problemática de perspectivas e é uma das nobres missões do médico geriatra. Há porém dificuldades.

Porque não é exequível deslocar as vivências do Idoso, fixado no passado, para o tempo presente no qual ele não se revê e encontra desorientação temporo-espacial, tempo incompatível com o seu misoneísmo, com as suas dificuldades adaptativas e a sua bradipsiquia, teremos de ser nós, médicos e cuidadores a deslocarmo-nos aos seus ambientes passados; aqui haverá encontro, entendimento, prazer restituído, vivência gratificante, melhoria dos seus défices psicológicos. Para tanto dispomos de dois instrumento primordiais que são mais “psicomatéria” que matéria prima concreta; eles aproximam-nos do Idoso e permitem que ele revivencie o seu tempo através de diálogo que preencherá algumas horas do seu dia. São eles a música e a fotografia desta época. Esta música, para o idoso não é som para os ouvidos, não é som escrito em pauta; é principalmente sensações, alegrias, paixões, melancolias, erotismo, factualidades, vivências, reminiscências inconscientes agora consciencializadas, reocupações, VIDA. A fotografia dos tempos e dos espaços em que o Idoso se situou são também óptimos auxiliares de revivescências.

O diálogo que resultará destas diligências deverá ser iniciado espontaneamente pelo Idoso e que nunca seja esquecido que dialogar é mais saber ouvir que saber dizer; devemos permitir que o Idoso mitigue a sua necessidade de falar, o que lhe mobilizará a cognição, a memória, a afectividade e também a motricidade.

Percepcionaremos a época e o espaço nos quais o Idoso se fixou não só pela informação de familiares, mas também pelo que o Idoso diz, pelas suas reminiscências e lamentações, e ainda pelos auxílios histórico, geográfico, cultural e o dos “usos e costumes”. Estas terapias, em alguns casos, recuperam para o Idoso tempos mais aproximados pela paulatina memorização das suas vivências, a partir da época em que se fixou para a actualidade; oferecem-lhe qualidade de vida existencial, menor sofrimento e melhores performances comportamentais. Beneficiam também o cuidador protegendo-o da “síndrome burnout”.

A senilidade não deve continuar a ser involução que isola; terá de ser desenvolvimento que socializa, terá de ser encontro, contemplação, humanização. Afinal onde se encontra a força do Ser Humano? Será só no impulso inconsciente inicial para a existência ou será também no desenvolvimento da Vida existencial?

A decadência relacionada com o senescer é principalmente biológica, não é a da verdadeira dimensão do Ser Humano – a espiritual, que é a sua Essencialidade.  Sejamos conscientes de nós próprios.